ZH Campo e Lavoura
A conta que não fecha entre a explosão dos custos de produção e a dificuldade para repassar preços diante da recessão colocaram setor de aves e suínos em crise. Operando no vermelho desde o início do ano, as duas cadeias de carnes mais organizadas no Estado recorrem à paralisação de unidades e colocam o pé no freio para reduzir os abates e diminuir o prejuízo. A grande pressão vem da escalada do preço do milho e, mais recentemente, também do farelo de soja, principais ingredientes da ração, item que responde por cerca de 70% do custo dos dois setores. No caso do milho, o preço da saca de 60 quilos pago ao produtor no Rio Grande do Sul, por exemplo, chegou semana passada à cotação média de R$ 47,71, valor 90% superior a um ano atrás.
O movimento é impulsionado pela safra menor no país e o forte crescimento das exportações. Em alguns municípios, o preço chega a R$ 55. Além de caro, o grão passou a ser escasso. A esperança de algum alívio vem pelo início da colheita da safrinha em Estados como o Paraná e Mato Grosso.
— A situação está crítica. Para os produtores independentes (que não são integrados à nenhuma empresa ou cooperativa), o quilo de comercialização do suíno na granja está em torno de R$ 3,70 e o custo de produção chega a R$ 4,20. Isto deixa o produtor no vermelho — diz o presidente da Associação dos Criadores do Suínos do Rio Grande do Sul (Acsurs), Valdecir Folador, acrescentando que o preço pago pelos animais caiu de um ano para cá.
O diretor-executivo do Sindicato de Produtos Suínos do Estado (Sips), Rogério Kerber, avalia que as empresas trabalham com um prejuízo de até 15% por cabeça. Para diminuir perdas, a ordem é abater animais com peso menor. Assim, por exemplo, passam menos tempo nas propriedades se alimentando.
— Os alojamentos devem ter alguma redução do mês de agosto em diante. A expectativa é de que, no quarto trimestre, já se experimente queda da oferta para abate — diz Kerber, lembrando que, devido ao ciclo de produção, não é possível diminuir agora o ritmo dos abatedouros.
Com o descompasso entre os custos e o que é possível repassar ao mercado, há relatos de integradoras atrasando pagamento a criadores.
Mais rápida em relação ao período de produção dos suínos, a avicultura sente de forma mais drástica a crise. O alojamento de pintos teve um corte de 5% em março e mais 5% em maio, quando o ritmo de abates começou a cair. A BRF anunciou paralisação temporária da unidade de Lajeado na segunda quinzena de julho e fechou uma planta em Jataí (GO). Em Passo Fundo, a Minuano encerrou as atividades e demitiu 300 funcionários após o fim de um contrato com a JBS. Em Morro Redondo, a Cosulati fechou as portas e fez 180 desligamentos. No Estado, são cerca de 10 mil criadores de aves. A atividade gera cerca de 60 mil empregos, entre diretos e indiretos.
A margem negativa das indústrias de frangos, com prejuízo desde o início do ano, está na média entre 8% e 10%, estima Nestor Freiberger, presidente da Associação de Avicultura do Estado (Asgav).
— Se o cenário não mudar, há grandes chances de termos mais notícias ruins — alerta Freiberger.
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O assessor de política agrícola da Federação dos Trabalhadores na Agricultura (Fetag) Marcio Roberto Langer avalia como um fracasso a estratégia para manter o abastecimento interno de milho, cultura que vem perdendo área para a soja e teve o quadro agravado pela aceleração das exportações a partir de 2015, aliado à quebra na produção por problemas climáticos em outras regiões do país.
— Temos desabastecimento de milho e preços nas nuvens. O valor mínimo fixado pelo governo federal é de R$ 17, a cotação a balcão chega a R$ 53. Isso mostra essa total desorganização — afirma.
Langer ressalta ainda que o cenário ideal seria de equilíbrio entre a rentabilidade do setor de carne e de grãos, sem que um lucre e traga dificuldades ao outro, ao mesmo tempo. A situação, diz o assessor, é preocupante também para os criadores totalmente integrados, que recebem os insumos das empresas para quem depois repassam os animais, sem adquirir ração. A redução do nível de abate também se traduz em menor remuneração para os produtores.