Correio Braziliense
Depois de sete anos de negociações, os Estados Unidos e o Japão fecharam um acordo histórico com 10 países banhados pelo Oceano Pacífico, denominado de Parceria Transpacífico (TPP, na sigla em inglês). Juntas, essas 12 economias representam 40% do Produto Interno Bruto (PIB) global: US$ 28 trilhões, conforme dados do Fundo Monetário Internacional (FMI) tendo como base o ano de 2014. Também integram o tratado Austrália, Brunei, Canadá, Chile, Cingapura, Malásia, México, Nova Zelândia, Peru e Vietnã.O TPP é visto como um marco de tendência de acordos regionais. Ele é considerado inovador e abrangente porque vai além da queda de barreiras tarifárias e não tarifárias em áreas o comércio de produtos industriais, alimentos, têxteis e serviços. Engloba também compras governamentais, e-commerce, telecomunicações, meio ambiente, propriedade intelectual e trabalho. O acordo ainda precisa ser aprovado pelo Congresso norte-americano.
A rapidez do acordo surpreendeu especialistas e governos, como o brasileiro, que não apostavam em uma finalização em tempo recorde. "É difícil medir o impacto desse acordo, mas, pelas estimativas iniciais, é possível que os países envolvidos devam ter aumento de US$ 300 bilhões no comércio entre eles. Para o Brasil, ainda precisaremos ver os detalhes do tratado, que só será divulgado daqui a um mês, mas é inegável que haverá perdas", explicou o economista Carlos Braga, professor de Política Internacional do instituto suíço IMD.
Preferência
O anúncio de ontem deixou exportadores de commodities bastante preocupados, segundo o presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro. "Os embarques de soja, milho, açúcar, suco de laranja e carnes são alguns produtos exportados pelo Brasil e que perderão a preferência dos países do bloco, criado para competir com a China. Essa aliança vai atingir o Brasil, com certeza", afirmou. A seu ver, o país deverá perder ainda mais participação no mercado global. "Neste ano, as exportações brasileiras devem encolher de 16% a 17% e a fatia do comércio nacional cairá de 1,18% para 0,98%. Isso faz com que o país retroceda a 2003", completou.
Castro e Braga criticaram a falta de uma estratégia mais agressiva do governo na área comercial e que resultou no isolamento do Brasil no cenário global. "Esse acordo mostra como o país está amarrado ao Mercosul e não consegue avançar", disse o professor do IMD. Para ele, o TPP sinaliza que o acordo multilateral da Rodada Doha - comércio global no âmbito da Organização Mundial do Comércio (OMC), iniciado em 2001 -, a principal aposta do Brasil foi equivocada. "Dohaainda não morreu porque os países-membros da OMC ainda não declararam sua morte, mas, na prática, está em coma. Houve um respiro em Bali, em 2013, mas nada foi implementado. Em dezembro, na conferência ministerial do Quênia, não se espera avanço significativo", disse.
Efeitos
O presidente do Conselho de Comércio Exterior da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Rubens Barbosa, afirmou que os empresários paulistas demonstraram preocupação com os efeitos do TPP para o país. "Eles estão muito preocupados com a perda de competitividade e com a inação do governo, que não tem uma agenda microeconômica que discuta questões como a Previdência, os juros altos, a infraestrutura precária e toda a agenda pendente para ampliar as exportações do país", destacou. "Só o câmbio melhorou, mas ele sozinho não resolve. É preciso ter essa agenda para atacar os desafios estruturais a fim de que o país recupere a capacidade de crescimento e o investimento da indústria", destacou.
O ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (Mdic), Armando Monteiro, tentou minimizar as críticas à falta de ação do governo na política internacional. "Desde que assumi, retomamos várias negociações com países estratégicos, como Estados Unidos e México", afirmou. Em relação ao TPP, ele admitiu que "existem perdas", mas que também existem muitas oportunidades que esse acordo pode oferecer: "Ele deve fortalecer o interesse da União Europeia no Mercosul".
Monteiro lembrou que, no fim de semana, o bloco concluiu a proposta para a troca de ofertas, que deverá ocorrer ainda este ano". Na avaliação de Braga, do IMD, dificilmente haverá um acordo com a UE, pois ele se arrasta há duas décadas e o que mais interessa ao Brasil e à Argentina, que é a liberação na área agrícola, dificilmente ocorrerá. "A Europa é muito protecionista nesse setor", alertou.
Parceria histórica
Historicamente, a Parceria Transpacífico (TPP) é uma expansão de acordo estratégico entre Brunei, Chile, Cingapura e Nova Zelândia, conhecido como P4 e iniciado em 2006. Dois anos depois, os oito demais países iniciaram negociações para um acordo mais amplo. De acordo com o departamento de comércio dos EUA, o tratado é o maior do Século 21, além de "ambicioso, abrangente e equilibrado".