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Uma vez que muitos produtos cárneos, para que sejam fatiados, são pré-formados em pedaços ou em peças, tais como embutidos, “fatiabilidade” pode ser definida como o rendimento cárneo de fatias funcionais de cada unidade pré-formada citada. O termo “funcional” subentende um mínimo de qualidade da fatia: a fatia deve manter sua integridade quando embalada e manuseada sem sinais de desfiadura ou fragmentação. Quando se fatiam produtos de músculo inteiro, fica claro que a extensão da carne, pela injeção de uma solução de salmoura retida, vai certamente elevar o rendimento de “fatiabilidade” por unidade de músculo inteiro, presumindo que tal extensão não afeta adversamente a integridade das fatias remanescentes.
Para se conseguir uma fatia de alta integridade, o produto cárneo deve ser constituído de uma matriz contínua, deformável, derivada tanto da estrutura natural do músculo intacto ou uma matriz formada a partir de pedaços e/ou partículas gelatinosos de carne. A “ligação” (aderência) de superfícies adjacentes de proteína cárnea deve ser maximizada pela garantia das condições iniciais adequadas das reações químicas da carne: pH (evitando ou melhorando carnes pálidas, moles e exsudativas), força iônica (níveis apropriados de sal adicionado, fosfato) e concentração de sólidos (evitando uma superextensão por adição de salmoura, exceto quando os ingredientes corretos de absorção de água são incluídos para haver compensação).
Uma matriz cárnea bem construída, sob a temperatura correta para permitir firmeza/coesão necessárias é, pois, posteriormente, fatiada da melhor forma possível por lâminas com afiação suficiente e fabricação e orientação adequadas.
Ingredientes adicionados
Carragenina e amido são aditivos comuns para melhorar a fatiabilidade da carne pela firmeza que dão à textura. Ambos funcionam, provavelmente, de maneira parecida: partículas pequenas (geralmente agindo em grânulos, no caso do amido) do hidrocoloide são dispostas na matriz cárnea sob injeção ou mistura. Esses aditivos demonstraram não se hidratar imediatamente até que o cozimento esteja, na verdade, em progresso. Dessa forma, a captação máxima de água ocorre apenas após as proteínas cárneas terem se desnaturado, para que o efeito seja parecido com o de um inchamento de “balões d’água” envoltos em uma matriz cárnea, ao invés da formação de uma matriz hidrocoloide à parte. Portanto, a habilidade de gelificação da carragenina nunca, na verdade, entra em ação; as propriedades de ligação de água são as mais importantes. Modificações químicas de amidos naturais podem potencializar sua capacidade de absorção de água.
Em contrapartida, sal e fosfatos agem diretamente nas proteínas da carne, ocasionando solubilização e formação de uma matriz de gel em produtos cárneos triturados/picados, o que causa retenção de água por meio de uma capilaridade aumentada da matriz. Em itens cárneos intactos, a matriz usual de fibra cárnea é induzida a inchar devido à repulsão elétrica sob força iônica mais elevada e complexo actomiosínico enfraquecido. A estrutura entumecida retém mais água para melhorar os rendimentos, ao mesmo tempo em que também dá firmeza à textura para aprimorar a fatiabilidade.
A adição de colágeno pode ter uma relação de sinergia com o amido e a carragenina. Todos os três são autolimitados quando usados separadamente, mas quando utilizados em combinação, pode-se conseguir níveis mais elevados de extensão ao mesmo tempo em que se mantém uma boa fatiabilidade, bem como um sabor bom. Em virtude de o colágeno trazer consigo uma classificação de caldo de carne natural, muitos consumidores não o consideram ser um “aglutinante” adicionado. Quando se pretende reduzir os níveis de sódio e/ou de fosfato de um produto, ou de quaisquer produtos de baixo alcance, somente o uso de colágeno poderá ser suficiente para ligar a água acrescida ao mesmo tempo em que é mantida a fatiabilidade. Alternativamente, a transglutaminase microbiana (TGase) também pode ser utilizada para potencializar a ligação da carne sob essas restrições, necessitando apenas que seja classificada como uma “enzima TG”. Outro uso especial do colágeno é o de refinamento da fatiabilidade do bacon, carne na qual amido, carragenina ou TGase não são permitidos de acordo com o padrão de identidade.
Soja e outras proteínas vegetais, bem como as caseínas do leite, também podem ser adicionadas para absorver água acrescida e melhorar a fatiabilidade. A TGase reage muito bem com a caseína para se gelificar com um sistema cárneo e apurar a fatiabilidade.
Temperatura
Temperatura em declínio abaixo do ponto de congelamento (que é bem abaixo de 0°C/32°F em produtos cárneos) sempre confere firmeza à estrutura porque as ligações de hidrogênio (termorreversíveis) entre as proteínas da carne são, dessa forma, aumentadas. Até mesmo a formação de alguns cristais de gelo pode adicionar a rigidez almejada e melhorar a fatiabilidade, porém a formação de gelo em demasia, especialmente se os cristais de gelo forem grandes devido a congelamento lento, pode danificar a estrutura cárnea e ocasionar fragmentação da carne durante o fatiamento.
Lâminas fatiadoras
Para um olho destreinado pode parecer que as lâminas fatiam em um ângulo de 90° em relação ao eixo da peça de embutido (ou seja, alinhadas com a superfície de corte da carne). À exceção de fatiadores com lâminas em conjunto, entretanto, esse normalmente não é o caso; uma leve inclinação da lâmina reduz a adesão e causa fricção com a superfície de corte da carne. Além disso, o formato da inclinação da lâmina (reto ou curvado), assim como, é claro, a afiação da lâmina, podem, juntos, trabalhar para diminuir a fricção entre a lâmina e o produto cárneo que está sendo fatiado. Isso significa menos deformação da fatia de carne e, consequentemente, menos danos durante o fatiamento. Por meio do aumento da firmeza da gordura na carne (principalmente diminuindo a temperatura cárnea), haverá diminuição de manchas de gordura que causam acúmulo na lâmina, o que aumentaria, também, a fricção. Qualquer acúmulo (sujeira) na lâmina causado por proteínas ou resíduos de gordura aumenta a fricção e, dessa forma, pode danificar a estrutura cárnea durante o fatiamento.
Uniformidade absoluta na grossura de fatiamento de um lado da fatia até o outro é muito importante na fabricação de charque, dado que uma variação de espessura resultaria em variação de desidratação. Fatiadores com uma lâmina só, mais caros e de alta velocidade alcançam essa uniformidade pelo temperamento (ganho de consistência) correto da carne antes do fatiamento, combinado com uma precisão de classificação referente à velocidade da lâmina de rotação involuta ou de ancinho afiado. Um fatiador com várias lâminas consegue obter uniformidade de fatiamento sem essa dependência do temperamento da carne, mas é limitado em relação à espessura de fatiamento, gerando fatias não menos finas do que um quarto de polegada (2,5 cm). Fatiadores desse tipo funcionam com bem menos rotações por minuto do que fatiadores com uma só lâmina desde que o montante de produção da matriz não esteja ligado à velocidade da lâmina, e podem ser bem mais baratos em custo e manutenção em comparação com um montante de produção similar.
A precisão em afiação, que originariamente surgiu de necessidades na área médica, está sendo, agora, aplicada a lâminas de fatiamento de carne. Espera-se que o grau de afiação prolongue o uso das lâminas duas vezes ou mais. O equipamento necessário é caro e, por conta disso, requer manutenção de lâminas em um local remoto. Mas, uma vez que um fabricante de lâminas tenha feito uma compensação de preço na taxa inicial de instalação, os custos de afiação, por lâmina, tornam-se mais baratos que os de um moedor convencional.