Endividamento e crédito mais caro vão desafiar a próxima safra de soja

Farming

O cenário para a safra de soja 2016/2017 vai exigir dos produtores cuidado redobrado com as finanças. A quebra de produção da segunda safra de milho 2015/2016 deixou muitos agricultores endividados, o custo de produção da soja deve subir e o aumento das taxas de juros encarece o crédito rural. A combinação desses fatores já aponta para um cenário de margens apertadas. “Não é hora de investir. Eu tinha um projeto para construir um armazém com três amigos, para armazenar 200 mil sacas de grãos, mas vamos adiar a ideia”, conta o produtor Regis Porazzi.



Porazzi produz grãos na fazenda RM Porazzi, com 1.100 hectares em Tapurah, no Mato Grosso. Acompanhando a previsão de clima desfavorável, ele reduziu a área plantada com milho na segunda safra 2015/2016 para menos da metade da fazenda, com 500 hectares cultivados. Ainda assim, Porazzi se surpreendeu com o resultado negativo. O produtor finalizou a colheita de milho no dia 22 de julho e está calculando os prejuízos causados pela seca. “Herdamos dívidas. Colhi menos de 20 sacas por hectare, terei um prejuízo de até R$ 1 mil por hectare de milho”, avalia.



Renegociação de contratos

Com a quebra da produção, o produtor conta que não conseguiu entregar 40% do volume de milho vendido com contratos antecipados. Muitos produtores de Mato Grosso vivenciam o mesmo dilema de Porazzi. Segundo ele, que também é presidente do Sindicato Rural de Tapurah, agora o foco dos produtores é conversar com os credores. “Vamos ter muitas reuniões para renegociar contratos, dívidas e multas”, conta Porazzi.



A situação delicada terá reflexos na próxima safra de soja. Na safra 2015/2016, Porazzi financiou 50% dos cultivos com recursos próprios e, com a quebra do milho, agora está descapitalizado. Por isso, o produtor conta que não pretende expandir a área plantada e será um ano de cautela. “Vou ter de financiar 100% da soja com crédito rural, então vou investir apenas o necessário”, diz Porazzi. “Muitos produtores estão se queixando porque o aumento dos juros vai onerar mais. Mas eu acho que é melhor ter essa taxa do que não ter crédito.”



A avaliação da Associação dos Produtores de Soja e Milho de Mato Grosso (Aprosoja-MT) é que a próxima safra vai representar uma fase de ajustes. “O produtor vai trabalhar para repor os prejuízos que teve com o milho safrinha e cumprir contratos”, diz Frederico Azevedo, gerente de Política Agrícola da Aprosoja-MT. “O produtor precisa ficar muito atento para garantir ganhos quando houver pico de cotação da soja na bolsa de Chicago ou um bom prêmio no porto.”



As mudanças da política de crédito rural

O Plano Agrícola e Pecuário 2016/2017, o chamado Plano Safra, disponibiliza R$ 185 bilhões para em crédito para os produtores rurais, enquanto a safra 2015/2016 contou com um volume de R$ 187,7 bilhões. As taxas de juros do crédito rural, que antes variavam entre 7,5% e 10,5% ao ano, avançaram para 8,5% a 11,25% ao ano.



De acordo com o secretário de Política Agrícola do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Neri Gueller, as taxas de juros são adequadas no atual cenário de crise econômica e taxa básica de juros (taxa selic) de 14,25%. “O setor acolheu muito bem o plano safra. O ajuste está dentro da linha da inflação, a taxa de juros do plano safra é suportável”, diz Gueller.



De acordo com o secretário, a boa notícia é que houve ampliação do limite de contratação para custeio. Na temporada passada, cada produtor podia contratar até 1,2 milhão de crédito rural com os juros controlados. Para captar mais recursos, o produtor contratava financiamento a juros livres, cujas taxas no mercado giravam em torno de 18%.



Agora, o Plano Safra 2016/2017 tem limite de contratação de R$ 3 milhões. As regras determinam que cada produtor pode contratar até R$ 1,8 milhão do crédito rural até dezembro de 2016 e R$ 1,2 milhão no primeiro semestre de 2017. “Isso é uma mudança extremamente importante, ainda mais num ano como esse. Falta dinheiro por causa da crise e o produtor está com problemas de capital de giro”, afirma o secretário. De acordo com Gueller, o governo vai se esforçar para atender a demanda por crédito do setor. “Vamos acompanhar a execução do plano safra. Se faltarem recursos, vamos trabalhar para tentar ampliar esses programas em janeiro”, afirma.



Alternativa de contratação

Outra mudança relevante está relacionada aos recursos da Letra de Crédito do Agronegócio (LCA). Do volume total de recursos captados via LCA pelos bancos, cerca de R$ 10 bilhões serão destinados ao custeio da produção com taxas de juros fixadas em 12,75% ao ano. Na prática, isso significa uma nova opção para os produtores que precisarem de crédito além do limite de R$ 3 milhões. “O agronegócio demanda mais recursos do que isso. Os produtores de maior porte sempre atenderam uma parte de sua atividade com taxas controladas e o restante com fontes alternativas”, diz Antonio Sidinei Senger, superintendente de crédito rural do Banco Cooperativo Sicredi. Segundo ele, a mudança da LCA oferece uma taxa intermediária, que é mais atraente do que contratar crédito a juros livres no mercado.



Apesar de perdas na segunda safra de milho causadas por intempéries, a maioria dos produtores cooperados do Sicredi, localizados nos estados do Paraná e Rio Grande do Sul, estão em situação financeira mais confortável. “Houve perdas localizadas, mas os nossos associados estão capitalizados e o aumento das taxas de juros não inviabiliza a atividade”, afirma Senger. A cooperativa projeta aumento de custo de produção entre 5% e 10% na safra 2016/2017 de soja. “Se o produtor mantiver a mesma área plantada e tecnologia, vai precisar de mais crédito”, diz. Segundo ele, o Sicredi já estima um crescimento de 20% das contratações de financiamento para a safra 2016/2017.



Data da Notícia: 27/07/2016
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