Avisite
Referindo-se ao texto no qual o AviSite chama a atenção para a nova onda de disseminação do vírus da Influenza Aviária (IA) por vários países e continentes (vide “Nova” Influenza Aviária é ameaça também para o Brasil), o médico veterinário Paulo Cesar Martins, Diretor Comercial da BioCamp Laboratórios e integrante da Diretoria Executiva da FACTA, observa que alertas do gênero são extremamente importantes para a Avicultura Brasileira.
Primeiro técnico brasileiro a concitar o setor a atentar e tomar precauções contra a Influenza Aviária (isso, há quase 15 anos, no início dos anos 2000), Paulo Martins lembra que mesmo com o desenvolvimento do modelo de compartimentação – ato pioneiro do Brasil – nenhum segmento da avicultura deve baixar a guarda em relação a esse problema sanitário, ainda que a IA seja considerada exótica em nosso País. Ressalta, porém, que os cuidados do setor não devem se limitar apenas à prevenção da IA. Precisam, necessariamente, estender-se a outras doenças.
Lembra, a propósito, que além de responder às necessidades internas – “metade da proteína animal consumida pelos brasileiros está representada por produtos avícolas” – a avicultura brasileira é responsável pelo abastecimento externo não só de carne de frango e de ovos, mas também de material genético, fornecido a vários países vizinhos e de outras partes do mundo. E há doenças – como a Newcastle (DN) – que, a exemplo da IA, podem afetar o acesso ao mercado externo. Ou seja: é um risco que a avicultura brasileira não pode se dar ao luxo de correr.
No texto que publicou, o AviSite cita que, geograficamente, há duas possíveis portas de entrada do vírus da IA no Brasil: pelo Sul e pelo Norte. Na mesma linha de raciocínio, Paulo Martins lembra que – do ponto de vista epidemiológico – também são duas as portas de chegada do vírus ao País. E explana:
“Em um primeiro momento, o organismo pode ser introduzido em uma região ou país através das aves migratórias, portadoras de vírus de IA de baixa patogenicidade. Neste caso, elas contaminam (através dos dejetos ou mesmo de carcaças de aves mortas) a água dos reservatórios (lagos e lagoas), o meio ambiente das pequenas criações ou até mesmo granjas situadas nas proximidades dos sítios de migração”.
O desdobramento dessa situação está representado pela circulação e multiplicação dos vírus, principalmente nos planteis de aves domésticas de vida mais longa, como criações de subsistência, poedeiras comerciais, matrizes, patos, etc. E, aqui, vírus que originalmente apresentavam baixa patogenicidade podem sofrer mutações, tornando-se de alta patogenicidade. Criam-se, dessa forma, as condições propícias à instalação do primeiro foco ou surto da IA.
O espaço de tempo necessário para tal transformação é variável – explica Paulo Martins. “Pode levar semanas ou mesmo meses”. Mas, segundo ele, aí está uma das principais oportunidades para a atuação da vigilância sanitária. De que forma? “Monitorando, sistematicamente, a presença de amostras de vírus de IA dos subtipos H5 ou H7, de baixa patogenicidade, em todos os planteis nacionais, principalmente os de maior risco, seja na granja ou abatedouro”. E acrescenta:
“É isso que possibilita o estabelecimento, em tempo hábil, de medidas preventivas para evitar a disseminação da amostra, bem como a eliminação do foco, de maneira mais precisa, econômica, sem maiores prejuízos à região. E apesar do aparente custo elevado da monitoria laboratorial sistemática, ele se torna inexpressivo quando comparado aos prejuízos econômicos e sociais que um surto de IA poderia trazer ao Brasil”.
Os riscos, porém, não cessam aí. Pois outra forma de surgimento de foco da IA é através da contaminação direta dos planteis por amostras de vírus de alta patogenicidade e virulência. Tais amostras também podem chegar através das aves migratórias. Mas a forma mais usual de contaminação é sua transmissão horizontal através de material infectado: homem, veículos de transporte, equipamentos, utensílios, alimentos e mesmo outras aves.
Conforme Paulo Martins, para tal tipo de surto, não há como agir preventivamente com monitorias laboratoriais. Sob tais circunstâncias, “o que resta às autoridades é a criação de força tarefa para o sacrifício imediato de todas as aves da propriedade e de um raio de, pelo menos, 3 quilômetros ao redor (stamping out), além da proibição radical do trânsito de qualquer material, animado ou inanimado - da propriedade afetada ou de toda a região. Inevitavelmente, isto traz inúmeros transtornos e prejuízos econômico-sociais consideráveis à população local, repercussão imediata negativa no consumo doméstico de aves e ovos, além de redução drástica nas exportações – atenção! – não somente de produtos avícolas”.
Como é inevitável recorrer ao exemplo de outros países que, como o Brasil, têm na avicultura importante contribuinte econômico e social, o técnico brasileiro cita os EUA, onde a produção animal conta com mais de 125 laboratórios, públicos e privados, credenciados para o diagnóstico veterinário, além de 68 laboratórios e/ou pesquisadores envolvidos diretamente no Plano Nacional de Melhoria Avícola (NPIP).
Além disso – destaca – “a avicultura norte-americana conta com mais de 50 laboratórios credenciados para realização de provas sorológicas para IA dos tipos H5 e H7. Entre outubro de 2009 e setembro de 2010, mais de 80.000 lotes, abatidos em mais de 130 plantas de abate foram submetidos a testes rotineiros para detecção de anticorpos contra amostras de vírus de IA H5 e H7. Isso sem contar os exames periódicos e sistemáticos em aves de postura comercial, perus, avestruzes, animais de fundo de quintal, aves de vida livre e/ou migratórias”. E conclui: “caso idêntico procedimento fosse instituído no Brasil (coleta de amostras, nos volumes mencionados, nas granjas e no abate), as amostras coletadas também poderiam ser analisadas para a Doença de Newcastle”.
Utopia? Nem tanto. A propósito, Paulo Martins rememora que há poucos meses (setembro passado) o Ministério da Agricultura anunciou a criação de uma entidade sul-americana voltada à integração dos laboratórios do continente na luta contra a IA. Batizado de Rede Sul-Americana de Laboratórios de Diagnóstico de Influenza Aviária e Doença de Newcastle (Resudia), o novo organismo propõe viabilizar a interação e troca de informações entre os laboratórios nacionais de cada país participante da iniciativa. “É um bom ponto de partida”, afirma, acrescentando esperar que “com esta iniciativa, os trabalhos de monitoria laboratorial (sorológico, virológico e por técnicas moleculares) sofram, de forma real e efetiva, um enorme impulso em nosso país”. E termina: “somente assim poderemos garantir a vigilância de IA e DN num setor de tão grande importância econômico-social para o Brasil”.